terça-feira, fevereiro 13, 2024

OS LIVROS QUE PUNHAM MEDO


A mãe da Sofia estava muito preocupada. A menina, de cinco anos, tinha medo dos livros. Tentaram explicar-lhe que os livros não são ruins, que nada mau podem fazer os livros, mas ela insistia que os seus livros lhe punham medo. Até falaram com a psicóloga do infantário, a qual também tentou explicar-lhe que os seus livros eram bons. Mas tudo foi inútil, a menina escondia-se debaixo dos cobertores e só queria ouvir os contos contados pela mãe, nada de tê-los perto. Por vezes, a Sofia até saltava para a cama dos pais, porque dizia que os livros olhavam para ela e a menina estava muito assustada.

— Não é bom que a Sofia tenha medo dos livros —comentava o pai—. Se não gostar deles, em adulto será uma ignorante porque não poderá estudar.

A mãe concordava com a opinião do pai, mas nenhum deles sabia o que podiam fazer. Porém, o problema da Sofia aconteceu estar a se repetir pelo bairro. Outros miudos da sua idade começaram a dizer que os livros eram assustadores. Os pais reuniram-se, contrataram psicólogos, mas era inútil, pelo menos dez miúdos tinham terror dos seus livros e não faziam mas do que se lamentar que tinham pesadelos noturnos de monstros saídos dos livros...

Até quando a avó Cristina, professora reformada, foi visitar a sua família. Quando os pais da Sofia lhe contaram o que acontecia, ela quis ver os livros. Pegou nalguns deles e começou a folheá-los. Ela própria teve que reconhecer que sentira medo.

— Vocês viram os desenhos destes livros? —perguntou a avó Cristina.

— Vimos. Estes albuns são o maior sucesso editorial atual. O que é que têm de particular? —quiseram saber os pais.

— Nos meus tempos —começou a explicar a avó—, os desenhos eram feitos para acompanhar os textos, mas estes livros, todos os que a menina tem cá, olhem, dão medo. Vocês viram estes narizes bicudos? E tanta cor cinzenta? E estes riscos que parece que querem saltar para os olhos? Eu própria tenho vontade de fechar estes livros e colocá-los em órbita!

Os pais ficaram muito surpreendidos. Mas tinham muita confiança na avó Cristina. Por isso, falaram com os outros pais, pois todos os meninos frequentavam o mesmo infantário e liam os mesmos livros. Deixaram a avó Cristina fazer uma prova: ela ofereceu-lhes livros com imagens a cores e formas redondas. Os miúdos reagiram de uma forma diferente ao verem os livros. Gostavam deles, já não tinham medo...

— Meninos —disse a avó Cristina—, agora façam uma coisa muito engraçada. Coloquem os vossos livros novos debaixo da cama, abertos por estas ilustrações tão giras.

Ninguém entendia nada, nem os pais nem os filhos.

— Façam como lhes digo —insistiu a velhota.

E obedeceram. Imediatamente, ouviram-se gritos interdimensionais de terror. Eram criaturas assusta-crianças que não resistiam aquelas imagens bonitas, tão diferentes das ilustrações de bichos bicudos. Fugiram todos dos seus esconderijos debaixo das camas e regressaram para os seus antros.

Nesse mesmo instante, num plano dimensional diferente, o responsável pelo Quadrante AP5XBAlpha informava o seu chefe, o Terrificador Máximo, de que o plano de mudar os sustos debaixo da cama por usarem ilustrações terroríficas fora um fiasco e que, se queriam continuar a assustar as crianças humanas, tinham que procurar um novo plano, mas até esse momento chegar, os humanos mais novos poderiam dormir tranquilos à noite.

© Frantz Ferentz, 2014/2024

Sem comentários: