quarta-feira, junho 04, 2014

OS LIVROS QUE PUNHAM MEDO [+10 anos]


   A mãe da Sofia estava muito preocupada. A menina, de cinco anos, tinha medo dos livros. Tentaram explicar-lhe que os livros são amigos, que nada mau podem fazer os livros, mas ela insistia que os seus livros lhe punham medo. Até falaram com a psicóloga do infantário, a qual também tentou explicar-lhe que os seus livros eram bons. Mas tudo foi inútil, a menina escondia-se por baixo dos cobertores e só queria ouvir os contos contados pela mãe, nada de tê-los perto. Por vezes, a Sofia até saltava para a cama dos pais, porque dizia que os livros olhavam para ela e a menina estava muito assustada.
    — Não é bom que a Sofia tenha medo dos livros —comentava o pai—. Se não gostar deles, em adulto será uma ignorante porque não poderá estudar.
   A mãe concordava com a opinião do pai, mas nenhum deles sabia o que podiam fazer. Porém, o problema da Sofia aconteceu estar a se repetir pelo bairro. Outros miudos da sua idade começaram a dizer que os livros eram assustadores. Os pais reuniram-se, contrataram psicólogos, mas era inútil, pelo menos dez miúdos tinham terror dos seus livros e não faziam mas do que se lamentar que tinham pesadelos noturnos de monstros saídos dos livros...
   Até quando a avó Cristina, professora reformada, foi visitar a sua família. Quando os pais da Sofia lhe contaram o que acontecia, ela quis ver os livros. Pegou nas mãos alguns deles e começou a folheá-los. Ela própria teve que reconhecer que sentira medo.
   — Vocês viram os desenhos destes livros? —perguntou a avó Cristina.
  — Vimos. Estes albuns são o maior sucesso editorial atual. O que é que têm de particular? —quiseram saber os pais.
   — Nos meus tempos —começou a explicar a avó—, os desenhos estavam feitos para acompanhar os textos, mas estes livros, todos os que a menina tem cá, olhem, dão medo. Vocês viram estes narizes bicudos? E tanta cor cinzenta? E estes riscos que parece que querem saltar para os olhos? Eu própria tenho vontade de fechar estes livros e colocá-los em órbita!
   Os pais ficaram muito surpreendidos. Mas tinham muita confiança na avó Cristina. Por isso, falaram com os outros pais, pois todos os meninos frequentavam o mesmo infantário e liam os mesmos livros. Deixaram a avó Cristina fazer uma prova: ela pediu aos miúdos fazerem eles próprios os desenhos; depois colou os desenhos dos meninos acima dos desenhos originais. Os miúdos reagiram de uma forma diferente ao verem os livros desenhados por eles próprios e por algum pai e mãe, que também gostavam de fazer desenhos, e até de um papagaio que apreendera a usar os lápis de cores. E os garotos gostavam deles, já não tinham medo... e leram com muito prazer!

   O mestre acabou de contar a estória. Estava certo que o editor, sentado em frente dele, entenderia que aqueles livros que publicava com aquelas ilustrações tão horríveis só causavam medo nos meninos. Era uma forma amável de lho explicar. Porém, o editor olhava sem compreender, por isso acabou perguntando:
   — Diga-me uma coisa: contou-me esta estória para me dizer que você também escreve contos e gostaria de publicar connosco?

Frantz Ferentz, 2014

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