quarta-feira, agosto 06, 2008

E foram felizes mas… não se casaram? [+10 anos].- XFC



    E o príncipe pediu à princesa que se casasse com ele.
    E a princesa, que estava namoradíssima dele, disse-lhe que sim.
    Então o príncipe anunciou ao seu pai, o rei, que ia casar com a princesa, que ela era a dona do seu coração. O rei ficou tudo contente com aquela notícia, e também a rainha, que pensava que o seu filho seria um solteiro para sempre, o qual não era boa coisa para o herdeiro da coroa.
    O rei fez chamar o seu conselheiro real. Disse-lhe assim:
    – Afinal, o meu filho encontrou a mulher do seu coração. Vai casar-se com ela.     Prepara tudo o preciso para o casamento.
    O conselheiro inclinou a cabeça e foi ver o cardeal e o notário maior. A ambos transmitiu os desejos do rei de organizarem o casamento do príncipe herdeiro.
    – Hmm, não sei eu se isso é tão singelo. Vejamos, qual é a religião da namorada do príncipe?
    – Pronto, e nem só isso. É válido o título de princesa que ela tem no nosso reino? Porque, se calhar, apenas equivale a condessa.
    O conselheiro, depois de ouvir as palavras do cardeal e do notário, correu à presença do rei para lhe contar o que lhe transmitiram aqueles dois importantes homens do reino.
    O rei chamou os dois homens e quis saber mais do assunto.
    – Sua Majestade sabe que um príncipe herdeiro não pode casar-se com uma princesa que não tenha a sua mesma religião. Onde se tem visto uma coisa igual? –exclamou o cardeal cheio de indignação com as suas roupagens a desprenderem cheiro a chocolate.
    – E nem só isso, Majestade –começou a dizer o notário maior–. Ela diz que é uma princesa, mas tem que demonstrá-lo. Mostrou qualquer documento onde o certifique? E caso de ela o ser, como sabemos que uma princesa do seu país está ao nível de uma nossa? Porque uma princesa estrangeira pode ser de menor categoria e, portanto, o nosso príncipe, o vosso filho, não poderia casar-se com uma mulher que não está à sua mesma altura... –e em dizendo isto, uma traça meio dormida saiu de baixo a manga do casaco do alto magistrado.
    O rei foi ver o seu filho e explicou-lhe tudo o que lhe disseram o cardeal e o notário. Ele rompeu a chorar, porque sim sabia que a princesa tinha outra religião, mas ignorava se o seu título de princesa era equivalente ao do seu próprio país. Contudo, já havia lá uma grande dificuldade para se casarem. Deveria pedir à princesa que mudasse a sua religião.
    E assim o fez:
    – Que eu mude a minha religião? –perguntou ela surpreendida– Não percebo para quê.
    – Tem de ser... –e o príncipe explicou-lhe que era uma regra do reino. Aliás, contou-lhe o do reconhecimento do se título de princesa.
    A princesa zangou-se muitíssimo. E sem falar com ninguém, foi até ao salão do trono onde na altura as vultos mais importantes do reino, o Conselho Real, discutiam assuntos de estado com o rei. E lá estavam também o cardeal e o magistrado maior.
    Todos ficaram com a boca aberta ao verem lá a princesa que entrara cheia de fúria. Foi direitamente para os dois homens. Primeiro falou com o notário maior, ao qual perguntou:
    – Vós sois a pessoa mais competente em leis deste reino, não é?
    – Hmmm... Sou, sim...
    – Então, podeis dizer-me que lei do vosso reino obriga o sol a sair pelo levante?
    Nessa altura interveio o cardeal:
    – Que disparate estais a dizer? Isso não é uma lei humana, é uma lei divina!!
    – Exato. Mas se um dia o sol saísse pelo poente, quem haveria de julgá-lo, os homens ou Deus?
    Tanto o cardeal como o notário, que começavam a entender as intenções da princesa, começaram a rir.
    Então a princesa anunciou:
    – Pois amanhã o sol sairá pelo poente. E às nove espero ver-vos aqui, nesta mesma sala.
    E, sem mais dizer, a princesa abandonou a sala.
    Todos ficaram em silêncio. Ninguém acreditara aquelas palavras, mas todos se sentiam curiosos por saber o que aconteceria no outro dia. Por isso, no seguinte alvorada, antes de o sol mostrar os seus primeiros raios, antes de os galos começarem a cantar, já todos os membros do Conselho Real estavam à espera de ver o que acontecia com o sol.
    Mas o sol não saiu pelo poente.
    Na realidade também não saiu pelo levante. De facto, o sol nem saiu. A noite continuou, viam-se as estrelas no céu perfeitamente. As corujas, já cansadas de voarem, não viam chegar a hora de descansarem num ramo; os falcões, mortos de fome, não alçavam o voo porque nem podiam ver por onde corriam os coelhos.
    E assim, às nove foram todos ao salão do trono.
    – Que fizestes? –perguntou o cardeal à princesa–. É um pacto com o diabo?
    – Se fazeis bruxaria, ireis à fogueira –gritou o notário.
    Mas a princesa, toda tranquila, disse:
    – O sol deixar-se-á ver daqui a dois minutos.
    Todos correram à janela. E, com efeito, depois de dois minutos, os primeiros raios do sol começaram a sair no céu.
    – É uma poderosa feiticeira!! –gritou o cardeal–. A queimá-la!!
    Mas a princesa disse:
    – É tudo natural. O que aconteceu foi que houve um eclipse de sol causado pela Lua.     Acho que um dos conselheiros aqui presentes pode confirmá-lo, porque é astrónomo.
    Com efeito, um dos conselheiros, sem um cabelo na cabeça mas com uma barba até aos pés disse:
    – A princesa tem razão...
    – E por que não o dissestes dantes? –perguntou indignado o notário maior.
    – Porque ninguém mo perguntou.
    A princesa continuou o seu discurso:
    – Vós não vistes por onde saiu o sol. Ele não respeitou as leis divinas de que durante o dia se deve ver o sol. Portanto, notário, Vós não podeis castigar o sol. E vós, cardeal, não podeis castigar Deus por ele próprio mudar quando quiser as leis da natura...
    O cardeal e o magistrado deram um passo para trás. Era terrível que uma rapariga jovem lhes desse lições a eles dois, os homens mais importantes do reino trás o rei.
    – Portanto, se vós não podeis impedir que seja noite de dia, também não podeis impedir que eu me case com o príncipe...
    – Majestade... –quiseram dizer os dois homens.
    – Calai-vos –ordenou o monarca–. A princesa tem toda a razão. Que se celebre o casamento!!
    E foi assim que a princesa se casou com o príncipe.
    E foram felizes... ou não?
    E...
    Mas essa já é outra história.


© Xavier Frías Conde
All rights reserved worldwide

Sem comentários: