O Jorge era um menino muito sujo. A sua mãe andava sempre trás dele para que se lavasse, para que mudasse a roupa, para que tirasse o cheiro a sujidade… Porém, o Jorge gostava demasiado da pocaria.
O Jorge morava numa granja onde havia muitos animais, entre os quais, logicamente, porcos. O menino adorava os porcos: eles sempre estavam cobertos de porcaria, deitados na lama. Quem for um porquinho, suspirava o Jorge.
Um dia, quando o Jorge se levantou, encontrou que na cozinha a mãe falava com alguém e não era ele precisamente. Não podia ser o pai porque estava fora de viagem nem o irmão maior. Então, quem era aquele indivíduo?
A mãe era muito amável com ele:
– Então, queres mais torradas? E chocolate? Está tudo bom, né?
O Jorge estava pasmado, mas quando mãe disse:
– Á Jorginho, queres que hoje vamos fazer compras à aldeia? Estou muito contente com a tua mudança. Se quiseres, vou comprar-te uma bola de futebol.
Então o estranho, que seguia a estar de costas para o Jorge, sentado na cadeira, em vez de falar, grunhiu:
– Gronh, gronh...
O Jorge estava ainda mais surpreendido. Achegou-se até à cadeira onde estava o estranho e comprovou com horror que era um porquinho. Mas nem só isso, o porquinho ia vestido, levava mesmo gravata e óculos. Além disso, pôde comprovar que o porquinho era mais limpo do que ele, porque até para tomar o chocolate na xícara fazia menos ruido, embora não usasse as mãos.
De repente a mãe virou-se e viu o verdadeiro Jorge:
– O que é isto? –gritou ela– um dos porcos escapou e veio para a cozinha!
Então apanhou a vassoura e bateu com ela no rabo do rapaz até obrigá-lo a sair de casa e entrar na corte dos porcos. Estes acolheram o seu novo companheiro com alegres "gronh" que provavelmente significavam "bem-vindo", mas isso é algo que não se pode comprovar porque na altura não havia intérprete de português-porqueiro.
O Jorge ficou ali, sentado no meio da porcaria, a olhar como a sua mãe ia para a aldeia com o porquinho, que chamava sempre Jorge.
Quando voltaram, duas horas depois, o porco saltava tudo contento, mesmo jogava com uma bola de futebol. O Jorge sentiu enveja. Observava toda a cena desde a pocilga, sem ser escutado pela sua mãe, que parecia não ouvir as suas lamentações.
Uma porquinha jovem pareceu estar interessada nele. Achegava-se para o menino muito tenra, pondo olhinos lindos, grunhendo com carinho, esticando o seu fozinho para lhe transmitir o seu interesse. O Jorge estava espantado, corria pela corte a fugir dela, mas a porquinha não se rendia e ia trás dele.
Finalmente a mãe veio trazer a comida para os porcos. Eram os restos da feijoada do meiodia. O menino já não o aturou mais. Escapou da corte e entrou em casa. A mãe não estava à vista. Porém, o porquinho estava a ver a televisão sozinho, tranquilo, a grunhir ligeiramente.
Durante vários dias, o Jorge via desde a janela como o porquinho vivia como um rei, com todas as atenções da mãe. Sentiu muita pena, porque para além de gostar da vida dos porcos, gostava mais da sua mãe.
Que tristeza tão grande. Assim passou uma semana em que o Jorge viveu sempre como um porco, o estilo de vida que sempre tinha querido para si.
Porém, aquilo não podia continuar assim. Decidiu que ia recuperar o seu lugar natural em casa, como humano. Entrou em casa na ponta das dedas. Antes de nada foi tomar um duche. Lavou-se como nunca se tinha lavado na sua vida. Tirou porcaria que tinha a sua mesma idade, isto é, doze anos. Ainda chegou a pensar que era pena desfazer-se de porcaria tão antiga, que provavelmente interessaria aos arqueólogos, mas a situação era muito grave. A água que saiu do duche chegou a produzir polução mais para abaixo por causa da porcaria acumulada, mas o importante era lavar-se, lavar-se, lavar-se.
Uma hora depois, o Jorge saiu do duche. Mesmo deitou-se colónia. Depois foi para o salão, agarrou o porquinho, tirou-lhe a roupa, incluindo o gravata e os óculos –ele de facto nunca tinha usado óculos, mas agora ia pô-los. A seguir apanhou o porquinho, levou-o para a corte e largou-o ali. A porquinha jovem, ao ver aquele porquinho ali, começou a esticar o fozinho e grunhir suavemente para ele. Era uma porquinha que se namorava muito facilmente. O Jorge, pelo seu lado, voltou para casa, sentou no sofá e ficou a ver a televisão.
Um bocadinho depois, entrou a mãe que ficou a olhar para ele. Observou-o atentamente da cabeça para os pés, como se não o reconhecesse. O Jorge ao final disse:
– Á, mãe, sou eu, o Jorge. É que não me reconheces?
A mãe hesitou um bocadinho e depois disse:
– É que por um momento pensei que eras um porquinho novo que me trouxeram ontem. Vocês são iguais. Mesmo sem esses óculos, diria que o porquinho é a tua personalidade secreta, como se fosses Superman… Aliás, nunca te vi tão limpinho, se calhar… –mas não seguiu a falar.
Porém, se vocês acham que o Jorge mudou para sempre, erram. O Jorge gostava imenso de ir feito um porco, de cheirar como um porco, de se tirar pela lama como um porco. Por isso, nalguns fins de semana, apanhava o porquinho da corte, punha-lhe os óculos, vestia-o e até lhe colocava a gravata e deixava-o em casa, para ele passar o fim de semana a viver como um porco. Felizmente, a porquinha namoradeira já encontrara o amor da sua vida, um grande porco que era pouco fino, mas que tinha muita enveja da capacidade do Jorge de se cobrir de lama.
O Jorge morava numa granja onde havia muitos animais, entre os quais, logicamente, porcos. O menino adorava os porcos: eles sempre estavam cobertos de porcaria, deitados na lama. Quem for um porquinho, suspirava o Jorge.
Um dia, quando o Jorge se levantou, encontrou que na cozinha a mãe falava com alguém e não era ele precisamente. Não podia ser o pai porque estava fora de viagem nem o irmão maior. Então, quem era aquele indivíduo?
A mãe era muito amável com ele:
– Então, queres mais torradas? E chocolate? Está tudo bom, né?
O Jorge estava pasmado, mas quando mãe disse:
– Á Jorginho, queres que hoje vamos fazer compras à aldeia? Estou muito contente com a tua mudança. Se quiseres, vou comprar-te uma bola de futebol.
Então o estranho, que seguia a estar de costas para o Jorge, sentado na cadeira, em vez de falar, grunhiu:
– Gronh, gronh...
O Jorge estava ainda mais surpreendido. Achegou-se até à cadeira onde estava o estranho e comprovou com horror que era um porquinho. Mas nem só isso, o porquinho ia vestido, levava mesmo gravata e óculos. Além disso, pôde comprovar que o porquinho era mais limpo do que ele, porque até para tomar o chocolate na xícara fazia menos ruido, embora não usasse as mãos.
De repente a mãe virou-se e viu o verdadeiro Jorge:
– O que é isto? –gritou ela– um dos porcos escapou e veio para a cozinha!
Então apanhou a vassoura e bateu com ela no rabo do rapaz até obrigá-lo a sair de casa e entrar na corte dos porcos. Estes acolheram o seu novo companheiro com alegres "gronh" que provavelmente significavam "bem-vindo", mas isso é algo que não se pode comprovar porque na altura não havia intérprete de português-porqueiro.
O Jorge ficou ali, sentado no meio da porcaria, a olhar como a sua mãe ia para a aldeia com o porquinho, que chamava sempre Jorge.
Quando voltaram, duas horas depois, o porco saltava tudo contento, mesmo jogava com uma bola de futebol. O Jorge sentiu enveja. Observava toda a cena desde a pocilga, sem ser escutado pela sua mãe, que parecia não ouvir as suas lamentações.
Uma porquinha jovem pareceu estar interessada nele. Achegava-se para o menino muito tenra, pondo olhinos lindos, grunhendo com carinho, esticando o seu fozinho para lhe transmitir o seu interesse. O Jorge estava espantado, corria pela corte a fugir dela, mas a porquinha não se rendia e ia trás dele.
Finalmente a mãe veio trazer a comida para os porcos. Eram os restos da feijoada do meiodia. O menino já não o aturou mais. Escapou da corte e entrou em casa. A mãe não estava à vista. Porém, o porquinho estava a ver a televisão sozinho, tranquilo, a grunhir ligeiramente.
Durante vários dias, o Jorge via desde a janela como o porquinho vivia como um rei, com todas as atenções da mãe. Sentiu muita pena, porque para além de gostar da vida dos porcos, gostava mais da sua mãe.
Que tristeza tão grande. Assim passou uma semana em que o Jorge viveu sempre como um porco, o estilo de vida que sempre tinha querido para si.
Porém, aquilo não podia continuar assim. Decidiu que ia recuperar o seu lugar natural em casa, como humano. Entrou em casa na ponta das dedas. Antes de nada foi tomar um duche. Lavou-se como nunca se tinha lavado na sua vida. Tirou porcaria que tinha a sua mesma idade, isto é, doze anos. Ainda chegou a pensar que era pena desfazer-se de porcaria tão antiga, que provavelmente interessaria aos arqueólogos, mas a situação era muito grave. A água que saiu do duche chegou a produzir polução mais para abaixo por causa da porcaria acumulada, mas o importante era lavar-se, lavar-se, lavar-se.
Uma hora depois, o Jorge saiu do duche. Mesmo deitou-se colónia. Depois foi para o salão, agarrou o porquinho, tirou-lhe a roupa, incluindo o gravata e os óculos –ele de facto nunca tinha usado óculos, mas agora ia pô-los. A seguir apanhou o porquinho, levou-o para a corte e largou-o ali. A porquinha jovem, ao ver aquele porquinho ali, começou a esticar o fozinho e grunhir suavemente para ele. Era uma porquinha que se namorava muito facilmente. O Jorge, pelo seu lado, voltou para casa, sentou no sofá e ficou a ver a televisão.
Um bocadinho depois, entrou a mãe que ficou a olhar para ele. Observou-o atentamente da cabeça para os pés, como se não o reconhecesse. O Jorge ao final disse:
– Á, mãe, sou eu, o Jorge. É que não me reconheces?
A mãe hesitou um bocadinho e depois disse:
– É que por um momento pensei que eras um porquinho novo que me trouxeram ontem. Vocês são iguais. Mesmo sem esses óculos, diria que o porquinho é a tua personalidade secreta, como se fosses Superman… Aliás, nunca te vi tão limpinho, se calhar… –mas não seguiu a falar.
Porém, se vocês acham que o Jorge mudou para sempre, erram. O Jorge gostava imenso de ir feito um porco, de cheirar como um porco, de se tirar pela lama como um porco. Por isso, nalguns fins de semana, apanhava o porquinho da corte, punha-lhe os óculos, vestia-o e até lhe colocava a gravata e deixava-o em casa, para ele passar o fim de semana a viver como um porco. Felizmente, a porquinha namoradeira já encontrara o amor da sua vida, um grande porco que era pouco fino, mas que tinha muita enveja da capacidade do Jorge de se cobrir de lama.
© Texto: Xavier Frías Conde, 2010
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